JS Braga

A minha triste casinha

André Lopes Patrão

André Lopes Patrão

Ex-Presidente da JS Braga

Depois do tema da “habitação” ter sido assunto, durante uma hora, no nosso “Ideias com J”, – programa de debate e discussão, por representantes jovens de partidos políticos ou juventudes partidárias, transmitido pela Antena Minho/Correio do Minho – não poderia deixar de versar sobre o assunto, nesta crónica quinzenal, na qual nos encontramos, com a dita frequência.

Apresentado recentemente, o Programa Mais Habitação surge com a necessidade de intervenção do Estado nesta matéria, face à situação atual de escassez de casas e de especulação imobiliária. No entanto, convém percebermos o contexto que exige a intervenção urgente do Estado, partilhada pela sociedade e empolada pela oposição, face aos cinco temas e às vinte e duas medidas apresentadas – que diga-se, de ressalva, que é pouco solidária com os jovens, que precisam de medidas concretas, com caráter de urgência, para se emanciparem.

Previsto como um direito fundamental, o direito à habitação é uma parte relevante da garantia da dignidade da pessoa humana e obriga o Estado a garantir acessos à habitação própria e a oferta de casas arrendadas. Para isso, deve promover a existência de casas a preço acessível e deve ter em atenção a capacidade económica das famílias, quer por sua iniciativa, quer pelo incentivo aos privados, quer na construção, quer no arrendamento. Ao mesmo tempo, deve promover a proteção da casa de morada de família, através de benefícios e isenções fiscais, assim como dos inquilinos, face a despejos injustificados, sem deixar de introduzir limites para os valores da renda, cumprindo com os desígnios da Constituição da República Portuguesa.

A realidade é que, em Portugal, sempre existiu a ideia de que o mercado resolveria as necessidades de habitação, pelo que o Estado cumpria uma função assistencialista, direcionada para os mais pobres e para os imigrantes – mas que resultou, em grande parte, na criação de guetos. A direita é capaz de não gostar desta ideia mas, na realidade, o mercado falhou e de que maneira.

De 95 a 2007, construíam-se cerca de 75 mil fogos, em média, por ano. Nos anos seguintes, deu-se a crise no sector da construção, que diminuiu acentuadamente a construção do número de novos fogos e que levou a que, de 2013 até agora, a diminuição se concretize na diminuição para 15 mil novos fogos ou menos, em média, por ano. Ao mesmo tempo, as taxas de juros baixas tornaram os créditos à habitação mais acessíveis e levaram ao aumento da procura de habitações para aquisição, até pela subida dos valores das rendas. Mais procura, menos oferta e, também mais agregados familiares, três ingredientes que combinaram numa receita explosiva e que afeta os preços das casas, aumentando-os exponencialmente.

O ataque político ao Programa Mais Habitação, no qual se pegou em medidas pontuais e pouco significativas – voltamos a perceber que temos fartura no que toca a especialistas – como a questão da “ocupação de casas devolutas e na crítica especulativa à medida de restringir possíveis novos “alojamentos locais”, para atacar e desvalorizar as restantes medidas, é “censurável”.

A Constituição promove o direito a habitação, defendendo o seu cariz social e, como tal, prioritário para a comunidade. Não podemos, por isso, procurar o benefício próprio, em primeira instância, promovendo a obtenção de rendimentos, especulando os preços e reduzindo a oferta de habitação para arrendamento ou até para venda, porque não é assim que construímos a comunidade e o futuro do nosso país.

Por isso, o programa vale-se em aspectos significativos, com o propósito de simplificar licenciamentos, multando as entidades responsáveis pelos atrasos, flexibilizar a utilização dos solos e de edifícios com licenças para comércio/serviços, incentivar a iniciativa privada, confiando os seus imóveis aos privados, através dos Contratos de Desenvolvimento para Habitação, e também incentivar a venda, a construção e disponibilização para arrendamento de imóveis, através de um conjunto de incentivos fiscais relevantes.

Longe de ser perfeito e de resolver todos os problemas da Habitação – nem seria possível, de uma assentada – a bolha da opinião mediática não escolheu o caminho do debate, da crítica construtiva e da apresentação de medidas que pudessem ser mais efectivas, mais bem elaboradas ou mais estruturadas e preferiu entrar na onda populista da crítica fácil e da diminuição. Mesmo sendo, coloca-se a questão, relembrando os “Xutos e Pontapés”: as saudades que eu já tenho de uma alegre casinha.

Artigo publicado em: Correio do Minho